Quando foi anunciado o segundo derivado de The Walking Dead muitos ficaram com o pé atrás. Afinal, seu primeiro spin-off não foi bem sucedido e não demorou para cair no esquecimento.
A premissa dessa nova série, de ser explorada pela ótica de quatro adolescentes, foi o tempero a mais para nos fazer torcer o nariz, uma vez que estamos rodeados de vários exemplos horrendos de séries do gênero.
Mas seguir World Beyond por essa linha pode diluir drasticamente sua imersão e deixar as ideias que a série propõe totalmente alheias.
Brave, o primeiro episódio, investe em uma narrativa mais pé no chão para nos apresentar uma comunidade de 9.671 pessoas, explorando as irmãs Bennett, que partilham do mesmo trauma da noite em que o Céu Caiu.
É por aí que o episódio trabalha o drama. Hope é uma rebelde que quer fugir da rotina de uma comunidade rica em vida para desbravar o desconhecido.
Já Iris é uma prodígio mais pé atrás, que durante todo esse tempo nos muros nunca dedicou-se verdadeiramente a si mesma, esbanjando carisma do qual esconde o desconforto com a Aliança e o medo de talvez nunca mais rever seu pai.
Por esse ponto, Iris se mostra a mais interessante do episódio de estreia. A vinda brusca dos flashbacks e pesadelos, portanto, é cabível e reforça ainda mais o quão perdida a personagem está em seu papel, ao ponto de ver a si mesma vagando por aí pela eternidade caso nada faça.
E quando alcançada a coragem, os goonies – ou qualquer outro grupo da cultura pop que vier a sua mente – são reunidos, dispostos a sair mundo afora mesmo que movidos por uma motivação o tanto genérica – nem todos, é claro.
Temos Elton, um nerd fujão e coletor de itens perdidos - também uma fusão de Milton com Eugene e talvez Jesus, só por saber karatê. E Silas, o grandão introvertido e zelador de Omaha. Uma equipe braba.
Resumidamente, a premiere se sustenta bem em seus núcleos inaugurais, apesar de sofrer alguns diálogos expositivos e repetitivos aqui e ali que me renderam algumas reviradas de olhos em certos momentos (cansei de ouvir que o paizinho foi comprar cigarro).
Então temos The Blaze of Gory, o segundo episódio, com um avanço quase considerável.
Renasce aquele sentimento de fragilidade em meio ao risco. Aqui, a resposta para a pergunta tácita no episódio anterior - realmente é necessário enfrentar o mundo a fora para compreende-lo? – fica evidente na virada de Hope, antes mais disposta a encarar de tudo um pouco, para agora adotar uma postura mais receosa dentre todos no rolê.
Postura essa compreensível. Afinal, um grupo movido por uma garota desfrutando de sua liberdade vai claramente os colocar num puta B.O..
É até divertido vê-los trombando com o perigo a cada esquina por mais bobos que sejam, desde o morto-vivo ligado no modo stealth até o zombee (tive que soltar essa) relaxando no banco.
Mais dinâmicas de grupo são exploradas além das problemáticas mortas-vivas. O roteiro também investe numa relação conjunto em momentos chaves, como na casa da árvore.
A bola de boliche Big Mo simboliza o coletivo, uma interação mais descontraída entre os jovens que a repassam de mão em mão para minutos depois, ser o mesmo objeto usado para se livrarem do moribundo persistente - ou tentarem.
Do outro lado temos Félix revisitando seu passado. A ideia reforça bem sua atual personalidade e motivação, ao mesmo tempo que cruza com a linha narrativa de Hope nos minutos finais quando a vemos seguindo entre as chamas, disposta a enfrentar o novo mundo e ser um outro alguém.
Assim como Félix também pôde, quando se viu sozinho e voltou para matar os pais zumbificados - em dez anos eles nunca saíram de casa? -, deixando o passado no passado.
Obviamente não será uma mudança imediata para Hope, apenas um gatilho como fora sua descoberta sobre os endlings, o que fará essa transformação vir gradativamente.
Deixo por último o momento que me fez mais franzir a testa: a travessia do Círculo de Fogo.
Ao que aparenta, nossos personagens incapazes de matar zumbis são verdadeiros mestres do churrasco que não inalam fumaça. Nenhum deles sequer tossiu mesmo depois de passar pelas 4:20 correndo mais que Usain Bolt.
E ainda por cima DORMIRAM no bendito lugar. - pode isso, produção?
Se forçar mais caga.
Creio que teremos mais flashbacks pré e durante o apocalipse para conhecermos melhor esses personagens que vão deixando pistas no ar. — Silas se culpou demais por não matar aquele zumbi. Huck tem uma baita cicatriz, mas continua mais calada que Chaplin.
E se a série conseguir sustentar os arquétipos aqui apresentados, teremos um leque de subtramas como o vindouro conflito entre Elton e as irmãs, e muitas mais com um baita potencial que pode render frutos ao resto da temporada.
World Beyond é uma versão light do TWDu, ao menos por enquanto. Investe em conflitos existenciais por vezes piegas e nas horas vagas no survival. Se não é a sua praia, é melhor ir ver o filme do Pelé.
Nota: 3,5/5