Análises Longas são são textos mais aprofundados e elaborados dos episódios de The Walking Dead, feitos por Tiago Toy, escritor e autor da saga “Terra Morta“, lançada pela editora Draco, que conta a história de uma epidemia zumbi ambientada em São Paulo. Atualmente trabalha na continuação do livro, no roteiro de uma HQ e na organização de uma coletânea, ambas baseadas no universo de “Terra Morta”.
ATENÇÃO: O texto abaixo apresenta spoilers, tanto da série quanto dos quadrinhos.
Só há uma definição para Killer Within: montanha-russa.
Está claro como cristal que a qualidade de The Walking Dead aumentou nesta terceira temporada, e o quarto episódio não me deixa mentir. Há um misto tão grande de emoções, e o roteiro e direção imersam o espectador com tamanha maestria levando a série a um nível acima. Nada de arrependimentos. Não será mais permitido fazer algo que não seja tão bom ou melhor. Os fãs vão cobrar, a mídia vai cobrar. Daqui pra frente, nada menos do que o excepcional, diretor.
Comparação com os quadrinhos (eu sei que toco nesse assunto em quase todos os textos, mas) não é mais necessária. Está explícito que os eventos ocorridos na HQ não têm a mínima importância na série. Acredito que os produtores mantiveram alguns detalhes até determinado ponto para não descartar os fãs dos quadrinhos logo na primeira temporada. Eles precisavam de público, e trabalhar em uma história sobre zumbis era pisar em ovos. Podia dar muito certo tanto quanto podia ser uma merda. O fandom era enorme, então era preciso agradá-los. Com um público tão grande, bastava esperar o boca-a-boca surtir efeito e Bam! Quando todos estivessem apaixonados pela série dramática, os quadrinhos seriam deixados de lado. Dois públicos em um. Uma jogada perfeita.
O episódio começa com alguém (o rosto não é mostrado) atraindo zumbis para dentro da prisão. Não entendi bem o que o fulano estava fazendo até que ficasse bem claro, lá para o começo do segundo terço. Não foi nenhuma surpresa quando sua identidade foi revelada: Andrew. Assim que Rick o deixara para morrer no segundo episódio, pensei “Esse cara não morreu, e vai voltar”. Pensei que ele fugiria e chegaria a Woodbury, então acabaria entregando a localização da prisão, mas não foi o que aconteceu. De um jeito ou de outro, ele seria responsável, mesmo que indiretamente, por derramamento de sangue.
Após a abertura, nossos queridos sobreviventes estão curtindo uma bela manhã onde nem os poucos zumbis mais próximos estragam o tom alegre. Glenn e Maggie estão namorando na torre de vigia, enquanto os outros se preparam para alguma tarefa externa. Rick ainda não confia nos detentos e ignora seu pedido de juntar-se ao grupo. O grupo está protegido enquanto Rick for responsável por eles, mas há um casulo tão forte os envolvendo que é possível que espantem até mesmo uma possível ajuda. Rick é firme em sua decisão: a dupla de ex-prisioneiros continuará no bloco ao qual foram designados, ou podem ficar a vontade para ir para a estrada. Ou seja, se ficar o bicho pega, se correr o bicho come. Ou seria o contrário?
Ciranda cirandinha não é a roupagem The Walking Dead, e o ar leve, descontraído, cheio de risos e olhares amigáveis estava condenado a acabar, o que acontece quando zumbis surgem no pátio da prisão, como se brotados do chão. Hershel, que estava treinando com as novas muletas, é ajudado pela caçula Beth a alcançar um local seguro – com direito a muletadas em um zumbi mais espertinho. T-Dog e Carol voltam por um corredor (após T-Dog ser mordido no braço), enquanto Lori e Maggie são escoltadas por Carl pelos corredores escuros da prisão. Carl é prova de que o legado de Rick continuará, mesmo depois de sua (quem sabe) morte. Carl está mais forte, durão, e depois desse episódio, qualquer chance de que um dia pudesse novamente ser a criança que fora há um ano não mais existem. Já vou dizer o motivo.
Rick, Glenn, Daryl e os ex-detentos estavam do outro lado, e correm desenfreados para ajudar. Para piorar, o alarme da prisão começa a soar, atraindo os errantes que andavam nas proximidades.
Em Woodbury, Michonne, que de burra não tem nada, vai verificar os carros trazidos para a comunidade e nota os buracos de bala. Instintivamente, sabe o que aconteceu, qual foi o fim dos soldados. O Governador aparece como uma sombra e é confrontado indiretamente pela espadachim. Finalmente consegui simpatizar com ela; talvez por não estar tão forçada como no terceiro episódio. Andrea não parece se lembrar que foi por causa do instinto da companheira que continuaram vivas por tanto tempo, e está quase que totalmente seduzida pel’O Governador, agora um Philip Blake. O vilão em potencial revela duas coisas: conta que tem uma filha (e nós sabemos o que isso significa, não é?), e, sem precisar de palavras, deixa transparecer que sente algo pela loira. Tenho uma certeza quase absoluta de que ele pretende matá-las assim que pisarem para fora de Woodbury, então está sofrendo antecipadamente por ter que matar a loira com quem teria chances de se envolver.
Andrea entrega a Merle um mapa explicando como chegar à fazenda de Hershel, para que ele tente encontrar seu irmão. Ela diz entender o que é o amor de irmão, uma vez que perdeu a irmã de forma tão dolorosa. Merle pede permissão para O Governador deixá-lo ir procurar Daryl, e recebe uma recusa. Sim, são todos marionetes nas mãos de Philip. Entendam, há uma boa intenção por trás da imagem de líder carrasco inalcançável: proteger Woodbury, seu porto seguro. Sinceramente, não o culpo.
De volta à prisão, chega o momento dos sacrifícios. Durante a semana passada, havia vazado um possível spoiler pela própria AMC: o resumo de Killer Within. Li, mesmo com receio de ser verdade. Fiquei com medo de que fosse. Seria muito cruel se fosse. E era.
T-Dog pode ter sido arrastado desde o começo, mas fizemos tantas piadas com sua existência que é impossível não se importar quando ele é mordido. Concordo que é um personagem dispensável, mas sua morte não foi gratuita. Em um último ato de heroísmo, (Ho)T-Dog vai pra cima de alguns zumbis com as mãos livres, permitindo que Carol fuja. Fim do T. Não consegui vibrar com sua morte. Todo o tempo ocioso em que ele permaneceu na série foi perdoado em sua última cena.
Lori, Maggie e Carl são encurralados na casa de máquinas da prisão. Seguindo a lei de que tudo que está ruim tende a piorar, Lori começa a sentir fortes contrações. Chegou a hora! Escolhendo salvar o bebê, Lori se despede de Carl em uma cena emocionante e pede para que ele não se torne mau. Após um “Boa noite, amor!”, Lori agoniza quando Maggie usa uma faca e corta sobre a antiga cicatriz da cesariana de Carl. Poucos segundos são o suficiente para Lori ficar inconsciente, e Maggie tira o bebê. É o fim da linha para Lori; não há qualquer possibilidade de conseguirem ajuda-la, e Carl sabe disso, tanto que fica sozinho com ela para o tiro de misericórdia, evitando que ela volte como um zumbi. Foi uma cena incrivelmente cruel, e se alguém conseguiu gostar de vê-la morrer – principalmente os que adoravam tachá-la como vagabunda – então não tem maturidade para entender todos os eventos que a levaram a tomar determinadas decisões. Ela não merecia aquele final, tanto quanto Carl não merecia ter que acabar com a própria mãe. Impossível não sentir lágrimas querendo sair.
Rick consegue desligar os alarmes e é surpreendido por Andrew, o ex-detento que fora deixado pra morrer. Como eu disse antes, não foi surpresa descobrir que foi ele quem jogou a merda no ventilador. Nocauteado, Rick perde a arma, que é pega por Oscar. Podendo se vingar do descaso de Rick para com ele, Oscar decide mostrar que é um cara de confiança, apesar dos pesares, e dispara um único e certeiro tiro na testa de Andrew. Problema resolvido… É o que você pensa, Sr. Rick Grimes.
A cena final com certeza fez muito marmanjo chorar. Não me encabulo de dizer que me emocionei pra caralho. Rick, Glenn, Daryl, os dois prisioneiros, Hershel e Beth voltam ao pátio agora livre de errantes. Carol não está entre eles. Do jeito que as coisas andam, não duvido nada que ela tenha o mesmo destino da filha.
Rick ouve um choro de bebê e vê Carl e Maggie com um recém nascido nos braços. A ficha cai na hora. A atuação de Andrew Lincoln arrepiou. Tendo passado os últimos meses tratando a esposa com frieza, agora só resta se arrepender. Nos quadrinhos, Lori é o alicerce que mantém Rick são; agora Carl é a única esperança da sanidade de Rick continuar intacta. Não acredito que ele vá morrer de amores pelo bebê (se seguir a história dos quadrinhos, será uma menina chamada Judith). Senti que ele não fez questão de sequer olhar para o bebê. Claro, o choque de perder a esposa foi grande, mas nem uma olhadinha? Talvez Glenn e Maggie fiquem responsáveis pela criança, pois nos quadrinhos eles se tornam “pais” de Sophia após o suicídio de Carol. O que estou falando? Quadrinhos e série não tem ligação alguma. Não mais. Qualquer um pode morrer, tudo pode acontecer. Não ficaria surpreso se Rick se mostrasse um vilão pior do que O Governador.
Descobri que é possível amar e odiar algo com a mesma intensidade após Killer Within. Quem foi, de fato, o “assassino interno” do título? Andrew? O bebê de Lori? Carl? Alcançando a nota máxima facilmente, este quarto episódio foi um comprometimento para conosco, que diz com letras garrafais: “SÓ PODE MELHORAR PARA OS FÃS, E PIORAR PARA OS SOBREVIVENTES”.